quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

MINHA VIDINHA NA ROÇA - Sá de Freitas


MINHA VIDINHA NA ROÇA
Sá de Freitas

(Que é o Saracura na poesia caipira)
 
Eu cá no meu sitiozinho,
Gosto de acordá cedinho,
Pra escutiá a passarada
Que, inhantes do sór nascê,
Parece qui vem dizê
Qui perciso i pra envernada.

Eita vida de Saúva...
Faça sór ou caia chuva
Pode mermo inté geá...
Pode sê dia de Missa,
Posso inté ta cum preguiça,
Mai perciso trabraiá.

Intão eu mi punho im pé,
Tomo um gole de café
E arreio o meu Curisco...
Cavalo de serventia,
Que corre iguar ventania,
Atráis du meu gado arisco.


Óio o pasto verdejante,
Que vai inté lá distante,
Além du sopé da Serra,
E sinto tanta alegria,
Que inté faço poesia,
Pru doce chero da terra.

Despois de reuni meu gado,
Eu fico mai sussegado
E vorto lá pra tapera,
Onde minha cabocrinha,
Tão humirde, coitadinha,
Sorridente mi espera.

Dô um abracinho nela,
Cum os zóião nas panela,
Espaida no fugão...
Ela já sabe o qui eu quero,
Sento à mesa e intão espero,
Meu virado de fejão.

Acho a cabocra atraente,
Pois só lhe farta dois dente
E as perninha é um poco fina.
Os zóio é meio tortinho,
Mai mi óia cum carinho,
Bem mais qui as muié grâfina.

Ela é meio curcundinha,
Sua voiz é fanhosinha,
Nela os peito nem se vê.
Mai eu tamém sô da roça,
Morano num paióça.
O que mai que posso tê?.

Cuitada! Qui judiação,
Sem pó di arroi, sem batão,
Nem um prefume lhe dô.
E quando nói vai deitá,
Perciso as venta tampá
Pra suportá o fedô.

Mai vô dá prela alegria...
Vô vendê uma novia,
Nem qui seja a mais magrela.
E compro prela uma fita,
Um vestidinho de chita
E um batão pros beiço dela.

Compro sandáias vermeia,
I tamém um par de meia,
Nem qui seja de argodão...
Quano nóis fô nu Arraiá,
Os cabocro vão falá:
Essa é muié de Barão.

I...Num tá bão?

 
Samuel Freitas de Oliveira
Avaré-SP-Brasil

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